A artista Vivyan P. Gonçalves nos apresenta sua exposição “Roça” através de um percurso que debate temas como espiritualidade, alquimia, fenômenos da natureza, fases da lua, os quatro elementos e ainda abre espaço para um debate sobre a atuação de um sistema capitalista desgovernado na Natureza.
A exposição se encontra na área rural de Teresópolis - RJ e inicia com a instalação Eco-experiência (2021), que apresenta um círculo de pedras. A circunferência da intervenção de rochas é grande o suficiente para caber um corpo, e o corpo - da artista - faz parte da obra, e é quase impossível não se sentir convidado a fazer parte também. A instalação é a primeira a ser vista e está localizada em frente a casa de Vivyan, como se dissesse: “bem-vindos ao meu universo”. Eco-experiência é também uma passagem, um início.
Ao seguir o caminho da estrada, a obra seguinte é Pontos de Observação Lunar (2022). Vivyan faz o mesmo movimento que a artista norte-americana Nancy Holt ao preparar um observatório, um ponto de vista. Holt usa dos túneis para ligar o espectador ao objeto a ser observado, o Sol; já Vivyan prepara o público para a Lua.
Como a exposição está instalada na serra, os quatro pontos de observatório da lua estão expostos em diferentes níveis, cada um posto de acordo com a melhor visualidade para a fase da lua indicada. O desenho vazado na madeira em formato das fases lunares nos convoca a observar a lua a partir de um ponto de vista já estabelecido, como se a artista estivesse nos mostrando um recado - e de fato está.
A instalação passa a fazer parte da paisagem da mesma forma que as pedras esculpidas pelos antigos incas em Machu Picchu foram abraçadas pelo cenário do local. Tomo o Templo de las Tres Ventanas como exemplo, assim como as janelas representavam as três divisões do mundo de acordo com os incas - o céu, a terra e o subterrâneo, representando a vida espiritual, a vida mundana e a vida interior - os pontos de observação nos instigam a analisar nosso satélite natural para além do óbvio, como um causador de efeitos do mar, mas também da ancestralidade.

Ao se deixar ser guiado pela Roça, o espectador é levado ao destino final dessa viagem intimista: o Ritual de Conexão (2022). E da mesma forma que se inicia, a exposição se fecha em outro círculo. Dessa vez, não são pedras, sólidas, duras, são cuias de barro que com o fogo transmutam as ervas através da sublimação e tornam a experiência mais sensorial. A composição se integra com a paisagem e mantém, sem contraste, a paisagem da natureza.
A artista demonstra durante o percurso como pensar a arte em um ambiente natural. A importância dos materiais que já fazem parte da Natureza levanta uma questão que a Land Art e as instalações ao ar livre enfrentam, refletindo com a Natureza em conjunto à obra, encarando o desafio dos resíduos que vão contra ao natural e impactando o mínimo no ambiente da exposição. As obras, além de contemplativas, são interativas e possibilitam além da visão, pois o tato é bem vindo e o olfato é necessário, e quem ousar utilizar do paladar também será acolhido. Roça, de Vivyan P. Gonçalves, expõe a beleza, a força e a imprevisibilidade da Natureza, às vezes corpo, às vezes pedra, às vezes madeira, às vezes fumaça.

Beatriz Ellen Roza
Há quatro fases de uma lua emoldurada ansiosa para encontrar no céu, talvez entre as nuvens do dia, seu espiador rochoso, satélite lua. Felix Guatarri olha sobre esses trabalhos a partir de uma ação humana que transforma e é transformada pela natureza. As peças se conectam com as três ecologias e nos mostram como outros universos podem ser observados em conjunto. Dessa forma, a natureza da artista está ali conversando com essas conexões ecológicas e místicas ao mesmo tempo. Então, das fases se pensa o tempo, onde essas fases são quase atemporais, tais as folhas pendentes ao ar, sendo apenas forma moldada pelo espaço. Pendula sobre a performance de seu ser. Emanuele Coccia trata desses aspectos vigiando a vida das plantas, também referenciando as obras expostas.
Os trabalhos da artista Vivyan Paquy de imediato nos mostram uma preocupação com a origem, O Berço, a gênese de tudo que tem à sua vista, mas principalmente sobre tudo que a cerca e a impõe um sentido nostálgico do tempo. Talvez ao lado do atemporal siga sua proximidade com os materiais e os próprios trabalhos, ao mesmo passo que nos confere a sensação de uma temporalidade findável. Onde e quando está o começo e aonde vai o fim? Essa é uma questão que está presente nas proposições da artista. Suas preocupações surgem de uma relação direta com o que pode ser mais puro e primo: a terra. A partir de experimentações com desenhos, argila e madeira, por exemplo, a artista expõe suas questões e pensamentos macro e microgeológicos, através do contato com a matéria.
A terra, neste caso, serve tanto para a criação e afirmação do processo expositivo quanto para sua manipulação. Em um trabalho, a pressão de um dedo pode ser vista impressa e ali formada, em qualquer coisa possível e imaginável. Noutro, uma lua como forma de um olho mágico tenta se encontrar com aquela crescente ou minguante que nos acompanha de perto, a lua, provável pedaço da Terra. É interessante perceber como os trabalhos têm uma conexão que impele uma justaposição de olhares ao mesmo tempo que nos indica pontos de vistas e sentimentos diferentes.

João Dos Santos